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domingo, 25 de outubro de 2015

A estranha passageira - crônica Stanislaw Ponte Preta

A ESTRANHA PASSAGEIRA - Stanislaw Ponte Preta

                                               A estranha passageira
Stanislaw Ponte Preta

- O senhor sabe? É a primeira vez que eu viajo de avião. Estou com zero hora de voo - e riu nervosinha, coitada.


Depois pediu que eu me sentasse ao seu lado, pois me achava muito calmo e isto iria fazer-lhe bem. Lá se ia a oportunidade de ler o romance policial que eu comprara no aeroporto, para me distrair na viagem. Suspirei e fiz de educado respondendo que estava às suas ordens. 

Madama entrou no avião sobraçando um monte de embrulhos, que segurava desajeitadamente. Gorda como era, custou a se encaixar na poltrona e arrumar todos aqueles pacotes. Depois não sabia como amarrar o cinto e eu tive de realizar essa operação em sua farta cintura.

Afinal estava ali pronta para viajar. Os outros passageiros estavam já se divertindo às minhas custas, a zombar do meu embaraço antes as perguntas que aquela senhora me fazia aos berros, como se estivesse em sua casa, entre pessoas íntimas. A coisa foi ficando ridícula:

- Para que esse saquinho aí? – foi a pergunta que fez, num tom de voz que parecia que ela estava no Rio e eu em São Paulo.

- É para a senhora usar em caso de necessidade – respondi baixinho.

Tenho certeza de que ninguém ouviu minha resposta, mas todos adivinharam qual foi, porque ela arregalou os olhos e exclamou: 

- Uai ...as necessidades neste saquinho? No avião não tem banheiro? Alguns passageiros riram, outros – por fineza – fingiram ignorar o lamentável equívoco da incômoda passageira de primeira viagem. Mas ela era um azougue ( embora com tantas carnes parecesse mais um açougue) e não parava de badalar. Olhava para trás, olhava para cima, mexia na poltrona e quase levou um tombo, quando puxou a alavanca e empurrou o encosto com força, caindo para trás e esparramando embrulhos por todos os lados 

O comandante já esquentara os motores e a aeronave estava parada, esperando ordens para ganhar a pista de decolagem. Percebi que minha vizinha de banco apertava os olhos e lia qualquer coisa. Logo veio a pergunta: 

- Quem é essa tal de emergência que tem uma porta só pra ela?

Expliquei que emergência não era ninguém, a porta é que era de emergência, isto é, em caso de necessidade, saía-se por ela.

Madama sossegou e os outros passageiros já estavam conformados com o término do “show”. Mesmo os que mais se divertiam com ele resolveram abrir jornais, revistas ou se acomodarem para tirar uma pestana durante a viagem.

Foi quando madama deu o último vexame. Olhou pela janela (ela pedira para ficar do lado da janelinha para ver a paisagem) e gritou:

- Puxa vida !!!

Todos olharam para ela, inclusive eu. Madama apontou para a janela e disse:

- Olha lá embaixo. 

Eu olhei. E ela acrescentou: - Como nós estamos voando alto, moço.

Olha só ... o pessoal lá embaixo parece formiga.

Suspirei e lasquei:

- Minha senhora, aquilo são formigas mesmo. O avião ainda não levantou voo.


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